UM SUCESSOR PARA OS BUDDENBROOK

Anna Luiza Cardoso

Uma das mais importantes autoras entre os grandes clássicos modernos alemães é Gabriele Tergit, famosa jornalista e escritora no período da República de Weimar. Em 1933, perseguida pelos nazistas por seu trabalho jornalístico crítico ao partido, emigrou para a Palestina. Em 1938, mudou-se para Londres, onde se estabeleceu. Seu trabalho foi amplamente conhecido e reconhecido à época, mas como grande parte da produção literária alemã do período entre e pós guerras, caiu no ostracismo, sendo recentemente resgatado pela Schöffling_ que, diga-se, junto às editoras Aufbau e Kiwi, faz um excelente trabalho de arqueologia editorial na Alemanha.

O principal romance de sua obra é EFFINGERS, originalmente publicado em 1951 e considerado pela Buchmarkt a mais importante saga familiar da literatura alemã desde Os Buddenbrook, de Thomas Mann. Schöffling relançou-o no ano passado e recebeu elogios avassaladores da crítica. As vendas também são excelentes, bateram a casa dos 30 mil exemplares em menos de um ano e o livro ficou semanas na lista de mais vendidos do Spiegel. Considerando tratar-se de um catatau de 900 páginas, digno dos grandes clássicos alemães, podemos dizer se tratar de verdadeiro fenômeno. A New York Review of Books, editora em língua inglesa de outro interessante romance da autora, KÄSEBIER TAKES BERLIN, originalmente publicado em 1932 e relançado pela Schöffling em 2017, acaba de confirmar que publicará EFFINGERS. Na Holanda o romance também saiu com imenso sucesso pela Van Maaskant Haun.

EFFINGERS narra a história de uma família judia ao longo de quatro gerações. Começa numa cidadezinha ao sul da Alemanha, em 1878, ainda no governo Bismarck, passa pela Berlim cosmopolita dos anos 20 e pela tragédia das duas guerras mundiais e termina em 1948. O olhar atento de Tergit aos costumes da época, sua perspicácia na construção das personagens e o humor cortante implícito aos seus diálogos fazem de sua voz narrativa uma das mais potentes e primorosas dentre as clássicas do período. Suas descrições das redações de jornal da época são especialmente saborosas_ ela trabalhou durante anos na seção cultural da Berliner Tageblat e essa experiência lhe deu as ferramentas e circunstâncias perfeitas ao desenvolvimento desse olhar perspicaz que envolve toda a sua obra.

EFFINGERS é a consolidação dessa voz, obra prima da autora e seu maior legado em termos da reconstrução do imaginário de um universo cuja compreensão se mostra cada dia mais necessária. Verdadeiro retrato de uma sociedade com um futuro brilhante que se auto destrói por questões tão mesquinhas e absurdamente atuais. E uma aula de sensibilidade poética e empatia profunda. Por ora, não há previsão de publicação no Brasil, mas estamos nos esforçando para preencher essa lacuna o mais rapidamente.