O QUE VOCÊ ESTÁ LENDO, LUIZE VALENTE?

Estou lendo “Viagens na Minha Terra”, do português Almeida Garrett. Em “Por que ler os Clássicos”, Italo Calvino diz que “ler pela primeira vez um grande livro na idade madura é um prazer extraordinário: diferente (mas não se pode dizer maior ou menor) se comparado a uma leitura da juventude”. É onde me encontro. Não estou relendo “Viagens…”: estou lendo pela primeira vez. Publicado originalmente em folhetim (1845/1846), foi lançado como livro em 1846. “Viagens na Minha Terra” é daqueles clássicos com rótulos poderosos: marco do movimento romântico, ponto de partida da moderna prosa literária portuguesa.

Garret transforma uma viagem “física” de cerca de 70km – o trajeto de Lisboa a Santarém, no Ribatejo – em “viagens” pela filosofia, história, literatura, política, religião, amor. É difícil enquadrar a narrativa num gênero literário. Com uma linguagem ora clássica ora popular, carregada de oralidade, entrelaça crônica, ensaio e novela em meio a digressões e reflexões de um Portugal que vive a decadência do Império.

Ler Garret, na idade madura, é uma experiência extraordinária, principalmente para quem tem em José Saramago e Eça de Queiroz referências fundamentais. Garrett abriu caminho para o realismo de Eça. Saramago o citava como uma das suas fortes influências. Já era mais do que hora de beber dessa fonte.

Luize Valente é autora dos romances O SEGREDO DO ORATÓRIO, UMA PRAÇA EM ANTUÉRPIA e SONATA EM AUSCHWITZ (este a sair dia 14 na Polônia) e dos contos DO TEMPO EM QUE VOYEUR PRECISAVA DE BINÓCULOS, todos publicados pela Record.